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Perdimento de mercadorias importadas: é devida a restituição dos tributos

Diego Joaquim
Para aqueles que já tiveram suas mercadorias confiscadas em decorrência da aplicação da pena de perdimento, sabem o quão tortuoso é o caminho para defesa de seus interesses que, normalmente, demandam investimento de anos entre processo administrativo, judicial e, se não bastasse, investigação criminal decorrente da lavratura da Representação Fiscal para fins Penais. Com tantas demandas envolvendo a pena de perdimento, não é incomum o importador que deixa de voltar seus olhos aos direitos tributários que a penalidade lhe garante.

É sabido que a pena de perdimento pode ser aplicada a veículos, mercadorias e moedas. Interessa-nos, para o desenvolvimento deste texto, quando aplicável às mercadorias importadas. E, considerando o disposto trazido pelo artigo 105 do Decreto-Lei nº 37/66 cc artigo 689 do atual Regulamento Aduaneiro[1], tal penalidade pressupõe configurado o dano ao Erário e várias são as hipóteses para sua aplicação, dentre elas, a falsidade material ou ideológica, subfaturamento, falsa declaração de conteúdo e interposição fraudulenta de terceiros.

Há, também, aplicação da pena de perdimento àquelas mercadorias que deixaram de ser submetidas a despacho aduaneiro e tiveram seu abandono decretado. Nesses casos, o importador deixa de proceder com a declaração de importação e não há que se falar em restituição de impostos.

Nos casos em que resta configurado o dano ao Erário, salvo exceções, os importadores têm sua mercadoria apreendida pela fiscalização para aplicação da pena de perdimento durante o processo de despacho aduaneiro, ou seja, após o registro da respectiva Declaração de Importação (DI) e o respectivo pagamento dos tributos incidentes na operação.

Uma vez aplicada tamanha penalidade, é devida a restituição ou compensação dos tributos recolhidos na importação. Apesar de entendimentos diversos, nosso entendimento é de que todos os tributos pagos quando do registro da Declaração de Importação poderão ser objeto de restituição ou compensação uma vez aplicada a pena de perdimento. A saber, II, IPI, PIS, COFINS e ICMS.

Senão vejamos.

Em se tratando do Imposto de Importação (II), a garantia de restituição ou compensação decorre da não incidência prevista pela legislação quando aplicada a pena de perdimento, conforme disposto no artigo 1º, §4º, III do Decreto-Lei nº 37/66 e o artigo 71 do Regulamento Aduaneiro:

“DECRETO-LEI nº 37/66

Art. 1º. O Imposto sobre a Importação incide sobre mercadoria estrangeira e tem como fato gerador sua entrada no Território Nacional. (…)

4o – O imposto não incide sobre mercadoria estrangeira: (…)
III – que tenha sido objeto de pena de perdimento, exceto na hipótese em que não seja localizada, tenha sido consumida ou revendida.” (g.n.)

“DECRETO nº 6.739/2009

Art. 71. O imposto não incide sobre:

(…)

III – mercadoria estrangeira que tenha sido objeto da pena de perdimento, exceto na hipótese em que não seja localizada, tenha sido consumida ou revendida.” (g.n.)

Frise-se, nesta oportunidade, que a não incidência pressupõe que a mercadoria esteja à disposição da fiscalização no momento da aplicação da pena de perdimento. Desta forma, não há que se falar em restituição nos casos em que a mercadoria não seja localizada, tenha sido consumida ou revendida.

Em se tratando das Contribuições PIS e COFINS incidentes na importação, a legislação acompanha o entendimento trazido acima acerca da não incidência, conforme disposto no artigo 2º, inciso III da Lei 10.864/2004:

“Art. 1º. Ficam instituídas a Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público incidente na Importação de Produtos Estrangeiros ou Serviços – PIS/PASEP-Importação e a Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social devida pelo Importador de Bens Estrangeiros ou Serviços do Exterior – COFINS-Importação, com base nos arts. 149, § 2o, inciso II, e 195, inciso IV, da Constituição Federal, observado o disposto no seu art. 195, § 6º.

Art. 2º. As contribuições instituídas no art. 1º desta Lei não incidem sobre: (…)
III – bens estrangeiros que tenham sido objeto de pena de perdimento, exceto nas hipóteses em que não sejam localizados, tenham sido consumidos ou revendidos;” (g.n.)

Para tanto, em se tratando de mercadoria importada do exterior e que tenha sido objeto da pena de perdimento durante o despacho aduaneiro – que esteja à disposição da fiscalização –, em se tratando do II, PIS e COFINS, é possível a restituição pelas vias administrativas mediante requerimento do importador, e observados os procedimentos estabelecidos pela Receita Federal do Brasil.

A saber, o Conselho Administrativo de Recursos Federais (CARF), decidiu de forma favorável aos importadores que tenham aplicada a pena de perdimento de suas mercadorias:

“Acórdão 3803-005.863, publicado em 05.06.2014
PERDIMENTO DEFINITIVO. RESTITUIÇÃO DE TRIBUTOS PAGOS.
O perdimento definitivo de mercadoria apreendida durante o despacho aduaneiro de importação afasta a incidência dos tributos sobre a importação, ao teor do inciso III do § 4º do art. 1º do Decreto-lei nº 37/66, porquanto a mercadoria foi localizada, não foi consumida nem revendida. Corolário disso, os tributos pagos por ocasião do registro da declaração de importação devem ser restituídos.” (g.n.)

Com relação ao IPI, a legislação não é tão clara e objetiva como para os demais casos e há precedente judicial julgando devida a incidência deste mesmo a importação seja considerada ilegal e aplicada a pena de perdimento[2]. Contudo, nosso entendimento é contrário a tal decisão, uma vez que a restituição, ressarcimento ou compensação é direito do importador após aplicado a penalidade de perdimento, seja pela não incidência do II, PIS e COFINS, ou pela não ocorrência do fato gerador, nos casos do IPI e ICMS.

Tal entendimento se aplica, não somente ao IPI, mas também ao ICMS, pois, em ambos os casos, o fato gerador é o mesmo[3]: “a ocorrência do desembaraço aduaneiro”. Uma vez aplicada a pena de perdimento durante o despacho aduaneiro, não há que se falar em conclusão da importação e liberação das mercadorias, o que, por consequência, não permite a ocorrência do fato gerador. Aplica-se, no nosso entendimento, inclusive, quando se trata de mercadoria submetida a canal verde de fiscalização que, em tese, tem emissão automática do Comprovante de Importação (CI que representa o desembaraço), quando tem o perdimento aplicado antes da liberação definitiva.

Tal entendimento foi recentemente abordado, perfeitamente, pela 8ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, conforme trechos abaixo[4]:

“Ora, com o perdimento parcial das mercadorias, por óbvio estas não foram desembaraçadas e, portanto, não ocorreu o fato gerador.
Destarte, o imposto recolhido foi indevido, devendo ser restituído.
Aliás, este foi o entendimento adotado pela Receita Federal, que concedeu a restituição do IPI ao apelante, cujo fato gerador é o mesmo do ICMS desembaraço aduaneiro conforme se vê a fls. 81v.

Ante o exposto, pelo meu voto, dá-se provimento ao recurso, a fim de condenar a Fazenda do Estado de São Paulo à restituição dos valores pagos a maior nas Declarações de Importação (…).” (g.n.)

Desta forma, uma vez que o importador efetua o pagamento antecipado dos tributos quando do registro da Declaração de Importação, e, durante o despacho aduaneiro, tem aplicada, de forma definitiva, a pena de perdimento, é devida a restituição, ressarcimento ou compensação de todos os tributos pagos. Seja pelo texto da lei, seja pela não ocorrência do fato gerador. Seja por vias administrativas ou judiciais.

Importa ressaltar, por fim, que o prazo para requerer a restituição dos tributos é de 05 (cinco) anos depois de aplicada de forma definitiva a pena de perdimento. E, uma vez verificada existência de valores a serem restituídos, os procedimentos, seja administrativos ou judiciais, devem ser conduzidos de forma que deem segurança aos importadores.

Diego Joaquim
Advogado. Especialista em Direito Internacional pela Escola Paulista de Direito. Formado em Intensivo de Comércio Exterior pelo SENAC Santos. Diretor Jurídico da Joaquim & Torres Sociedade de Advogados. Membro da Comissão de Direito Aduaneiro da OAB Santos. Professor de Legislação Aduaneira na Central de Concursos. Participante em diversos cursos relacionados ao Comércio Exterior.

***

[1] Decreto nº 6.759 de 05 de fevereiro de 2009.

[2] TRF 2ª Região. (AC 200550010108019 – AC APELAÇÃO CIVEL ­ 484108) APELAÇÃO CÍVEL. NACIONALIZAÇÃO DE BENS IMPORTADOS. ADMISSÃO TEMPORÁRIA. IMPORTAÇÃO IRREGULAR. PERDIMENTO DE BENS. CONVERSÃO EM RENDA DA UNIÃO. NÃO INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO, PIS E COFINS. (…) A imposição da pena de perdimento de bens encontra amparo na legislação pátria e é consequência do cometimento de dano ao Erário, oriundo de conduta dolosa (TRF2, 4ª Turma Especializada, AC 468828. Rel. Des. Fed. LUIS ANTONIO SOARES, E­DJF2R, 2.12.2011) A autoridade aduaneira, como órgão da Administração Pública, está adstrita ao princípio da legalidade, tendo o poder­dever de aplicar sanções administrativas quando constatadas irregularidades. O IPI incide ainda que a importação seja inválida, irregular ou ilegal em virtude da aplicação do princípio do non olet. Tanto o Imposto de Importação como o PIS e a COFINS não incidem nos casos de aplicação da pena de perdimento de bens, por força do art. 1º, §4º, II, do Decreto­Lei nº 37/66 e do art. 2º, III, da Lei 10.865/2004. 6. Apelação parcialmente provida apenas no tocante à conversão em renda da União dos valores referentes ao PIS e à COFINS, considerando que tais tributos não incidem nos casos de decretação da pena de perdimento de bens. Condenação de verbas honorárias mantida”.

[3] No caso do IPI, artigo 238 do Regulamento Aduaneiro, e para o ICMS, artigo 12, IX da Lei Kandir (Lei Complementar nº 87/96).

[4] Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. 8ª Câmara de Direito Público. Relatora Cristina Cotrofe. Apelação nº 0024738-39.2013.8.26.0053.

Fonte: COMEX do Brasil

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