Ministério destaca custo maior que salários. Economistas defendem debate sobre impacto
BRASÍLIA E RIO - Pouco mais de um mês depois das críticas do ministro Joaquim Levy à política de desoneração da folha de pagamentos, o Ministério da Fazenda divulgou uma nota técnica em que afirma que o custo fiscal do programa, por emprego criado ou preservado, é muito superior ao salário inicial médio de cada trabalhador. A conta fiscal é a relação entre o montante que o governo deixou de receber em impostos e o número de vagas geradas ou mantidas. Economistas destacam que um debate amplo deve incluir o impacto total na economia, por exemplo o quanto esses salários preservados podem representar em consumo e seu efeito na atividade.
Citando quatro estudos, três deles da Fundação Getulio Vargas (FGV) encomendados pela Fazenda, a nota técnica da Secretaria de Política Econômica diz que cada emprego ligado à desoneração da folha teve um custo fiscal entre R$ 58 mil e R$ 67 mil por ano. O documento faz a comparação com um salário médio de admissão no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, de R$ 1.700 por mês, ou cerca de R$ 20.400 anuais. Significaria um custo fiscal três vezes superior ao salário. Os estudos não consideram o salário médio dos setores beneficiados.
EXPORTAÇÕES E VENDAS
O governo avalia que “as medidas de desoneração, especialmente com a renúncia tributária gerada, não trouxeram benefícios econômicos e de geração de empregos significativos”. Considerando o custo da dívida pública, destaca o ministério, a renúncia tributária mostra-se “excessivamente onerosa", alcançando 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB). “Como comparação, a meta de superávit primário para 2015 é de 1,2% do PIB”, diz a nota.
De acordo com o pesquisador do Ibre/FGV José Roberto Afonso, para uma avaliação precisa sobre o impacto na economia como um todo, é necessário reunir dados de emprego, exportações e vendas das empresas, por exemplo. Nos estudos usados pela Fazenda, citam-se as variáveis de exportação e importação. Segundo a nota, “muitas das estimativas de aumento de empregos ou exportações nos estudos referidos não têm significância estatística, sinalizando que a política terá sido inócua”.
AFONSO CRITICA DESONERAÇÃO
— O que vimos em estudo recente do Ibre/FGV é que a renúncia fiscal é cada vez maior e a política beneficia mais empresas de serviços que da indústria. Além disso, pune o aumento da produtividade — diz o economista. — Mas é importante o debate. Quanto mais informação, melhor.
Para Afonso, a Receita Federal pode ajudar os pesquisadores a fazer avaliações mais precisas se divulgar, sem quebra de sigilo, e por setor, os dados de cada contribuinte: previdenciário, fiscal, de emprego e de massa salarial.
Outros economistas também explicam que é necessário estimar o que teria ocorrido sem a existência da desoneração, um cálculo bem mais complexo.
Dissertação de mestrado do economista Clóvis Scherer, pesquisador do Dieese, mostrou que pagar menos imposto sobre o trabalho criou mais empregos e fez a renda subir. Pelas contas de Scherer, em um ano, as empresas que optaram pela tributação sobre o faturamento contrataram 31 mil funcionários, sendo 93% dessas vagas, ou 29 mil, exclusivamente pela desoneração criada no primeiro governo Dilma.
Na avaliação do ministério, a eficiência do projeto é questionável. Além disso, o documento estima que o custo fiscal da desoneração cresceu de forma paulatina, até atingir R$ 20,7 bilhões em 2014. Segundo o texto, após a sexta medida provisória tratando do assunto, mais de 80 mil empresas já estavam sendo beneficiadas, com custo mensal de R$ 1,8 bilhão.
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PROJETO DE LEI
A política de desoneração da folha de pagamentos foi iniciada em 2011, no plano “Brasil Maior”, com o objetivo de reduzir a carga tributária de empresas que fossem grandes empregadoras de mão de obra, para criar empregos e incentivar a formalização dos contratos de trabalho. O programa do governo permitiu que uma empresa deixasse de pagar os 20% de contribuição previdenciária sobre o valor de sua folha de pagamento e optasse por pagar 1% ou 2% (dependendo do setor) sobre o faturamento.
No fim de 2013, a presidente Dilma Rousseff prometeu que o governo tornaria a medida uma política permanente de redução do custos do trabalho. Mas, em fevereiro, o governo enviou medida provisória (MP) aumentando as alíquotas sobre o faturamento das empresas para 2,5% e 4,5%, praticamente anulando a desoneração. Levy chegou a afirmar que a “brincadeira” da desoneração custava R$ 25 bilhões por ano e não protegia o emprego. Disse que o custo de cada vaga era de R$ 80 mil, R$ 100 mil, e que “gastar isso para manter um emprego não vale a pena”.
O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), devolveu a MP ao Planalto, que teve de encaminhar as mudanças como projeto de lei, o que exige mais discussão. Dificilmente será mantida a proposta original.
POR CRISTIANE BONFANTI E LUCIANNE CARNEIRO
Fonte: O Globo
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