Os contribuintes que promovem a realização de operações de comércio exterior tiveram uma importante vitória na 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em matéria aduaneira. Segundo recente decisão da Corte (Recurso Especial nº 1.555.004), as autoridades aduaneiras não podem alterar a classificação fiscal de determinado produto que tenha sido classificado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de forma diversa.
A classificação fiscal de mercadorias no Brasil constitui uma atividade de competência da Secretaria da Receita Federal do Brasil que, para tanto, se vale de regras técnicas específicas indicadas no Regulamento Aduaneiro (Art. 15, XIXI, do Decreto nº 7.482/2011). Muitas vezes, porém, a classificação fiscal adotada pelas autoridades aduaneiras e fiscais se choca com aquela dada por outros órgãos da administração pública para fins regulatórios (notadamente, Ibama e Anvisa).
Essa divergência entre o Fisco e as demais autoridades administrativas acaba gerando, não raro, um contencioso aduaneiro e fiscal decorrente da aplicação de multas e outras sanções aos contribuintes, encarecendo custos de conformidade e, ao mesmo tempo, criando um cenário de forte insegurança jurídica.
A divergência entre Fisco e demais autoridades administrativas gera um contencioso aduaneiro e fiscal
Nos tribunais estaduais a matéria vinha sendo decidida, majoritariamente, em favor dos contribuintes. Em diversos julgados no âmbito do Tribunal de Justiça da Bahia, por exemplo, entendeu-se que a classificação fiscal atribuída pela Anvisa não poderia ser ignorada por autoridades fiscais para fins tributários (Apelação Cível nº 0140774-87.2008.8.05.0001)
No caso examinado pelo STJ, determinada empresa classificou o produto que importava como cosmético, observando inclusive o registro feito na Anvisa. As autoridades aduaneiras, todavia, aplicavam ao produto a classificação fiscal de medicamentos, levando, consequentemente, a uma tributação majorada.
Segundo decidiu a 1ª Turma, por unanimidade de votos, as autoridades aduaneiras não poderiam alterar a classificação de um produto atribuída pela Anvisa, tendo em vista a competência legal deste último órgão para “regulamentar, controlar e fiscalizar os produtos e serviços que envolvam a saúde pública”. Além de se basear na competência legal do órgão, a decisão do STJ também observou as confusões e perplexidades que seriam geradas diante da possibilidade de atribuição de classificações fiscais distintas por órgãos diversos da administração pública federal, ressaltando-se a tendência das autoridades aduaneiras em atribuir a classificação que maximizasse a arrecadação tributária.
Tal decisão se mostra juridicamente acertada, reforçando o entendimento já corrente de que as autoridades fiscais (e também aduaneiras) não podem deturpar o sentido e os conceitos adotados pela legislação tributária e fixados por outros ramos do direito. Vale lembrar, a respeito, que o Supremo Tribunal Federal (STF) já houvera censurado anterior tentativa do legislador tributário em “modificar” o conceito de valor aduaneiro para fins de incidência de tributos na importação (Recurso Extraordinário nº 559.937, Rel. min. Dias Toffoli).
A importância desta decisão, que analisou pontualmente o conflito entre as classificações atribuídas pela Anvisa e pelas autoridades aduaneiras, é ainda maior se considerados os diversos questionamentos existentes nos Estados e no Distrito Federal quanto à classificação de mercadorias para fins de apuração do ICMS incidente no desembaraço aduaneiro.
Embora o caso específico tenha analisado a situação pontual de produtos sujeitos a registro na Anvisa, o precedente serve como um norte para outros litígios semelhantes que se dão no âmbito de outros órgãos com competência para fiscalização de certos produtos, como gêneros alimentícios, livros, dentre outros itens.
Além de conferir maior segurança jurídica aos contribuintes que possuem registros de seus produtos nos órgãos competentes (Anvisa, Ibama, dentre outros), tal decisão se mostra particularmente relevante no contexto da atual crise econômica, pois poderá promover uma redução dos custos de conformidade incorridos pelos contribuintes para o cumprimento das diversas obrigações tributárias e aduaneiras impostas pela legislação.
Por Fábio T. Ramos Fernandes e André Luiz Pereira
Fábio Tadeu Ramos Fernandes e André Luiz Pereira integram a área tributária de Inglez, Werneck, Ramos, Cury e Françolin Advogados
Fonte: Valor Econômico via Notícias Fiscais
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