Neste artigo quero chamar a atenção para uma questão polêmica, mas ainda desconhecida por muitos, que é a discussão a respeito da incidência do PIS e da COFINS sobre créditos presumidos do ICMS.
Alcance da discussão
Este problema está restrito às empresas do regime não cumulativo, no qual o fato gerador das contribuições alcança todas as receitas auferidas pela empresa (art. 1º, § 1º, das Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003), diferentemente do regime cumulativo, limitado ao faturamento (arts. 2º e 3º da Lei nº 9.718/98).
A discussão gira em torno da compreensão do total de receitas, uma vez que as leis não entram nesse detalhe. A Receita Federal, por seu turno, acaba tendo uma visão muito ampla. Analisando suas diversas soluções de consulta ou as atuações que promovem e que se convertem em discussões administrativas ou judiciais, podemos concluir que o fisco toma emprestada a definição contábil de receita para definir o conceito tributário.
Conceito contábil de receita
Cabe um parêntese aqui para lembrarmos o conceito de receita segundo a Contabilidade. De acordo com a definição do Comitê de Pronunciamentos Contábeis, “as receitas são aumentos nos benefícios econômicos durante o período contábil”. Vejam que para a contabilidade a definição de receita vai muito além de ingressos financeiros, alcançando todos as entradas que “que resultam em aumentos do patrimônio líquido”.
Impacto contábil do crédito presumido
Há vários tipos de créditos presumidos e suas formas de concessão podem impactar no reconhecimento contábil. Um crédito presumido apurado com base em uma compra, por exemplo, terá o mesmo impacto de um crédito normal, ou seja, reduzirá o custo da mercadoria adquirida. Consequentemente, não há preocupações quanto à geração de receita e à incidência do PIS e da COFINS.
Mas são muito comuns os créditos presumidos calculados com base em outros fatores, como nas saídas da empresa. É aí que nasce o problema! Neste caso, teríamos um crédito presumido do ICMS cuja contrapartida seria uma conta de resultado. E toda vez que creditamos uma conta de resultado temos uma receita contábil.
Lembrando do raciocínio do fisco, teríamos, consequentemente, a incidência do PIS e da COFINS. É a resposta que encontramos, por exemplo, na Solução de Divergência nº 13/2011.
Exceção: subvenção de investimento
É importante destacar, ainda, que nem todo crédito presumido, mesmo que gere receita na contabilidade, seria tributado pelo PIS e pela COFINS, pois as próprias Leis excepcionam da incidência as subvenções de investimento (art. 1º, § 3º, X, da Lei 10.637 e art. 1º, § 3º, IX, da Leis nº 10.833). Um exemplo são aqueles créditos concedidos em contrapartida à aquisição de máquinas ou à ampliação do parque fabril, ou seja, que necessitam de um investimento.
Se a contrapartida, no entanto, for apenas para contratar pessoas ou fazer frente a outros gastos, estaremos diante de uma subvenção de custeio, não abrangida pela exceção legal.
E não pense que é tão fácil detectar se uma subvenção é de investimento ou de custeio, pois os estados não são tão claros quanto à exigência da contrapartida. Temos inúmeras discussões que ficam centradas em identificar a natureza do crédito presumido. Neste sentido seguem a Solução de Consulta COSIT nº 188/2015 e o Acórdão nº 9303002.618 da Câmara Superior de Recursos Fiscais – CSRF.
É legítimo emprestar a definição contábil?
Certamente causa arrepio aos positivistas a afirmação de que a Receita Federal toma emprestada a definição contábil para compreender a extensão da receita tributária. Isso decorre do fato de entenderem que qualquer conceito, quando ingressado no universo jurídico, passa a ter uma nova definição, que não se confunde com o entendimento empregado pelas “ciências pré-jurídicas”.
Foi neste sentido, inclusive, a decisão do Supremo Tribunal Federal de 2013 no Recurso Extraordinário 606.107, ao dispor que “o conceito de receita, acolhido pelo art. 195, I, ‘b’, da Constituição Federal, não se confunde com o conceito contábil”.
Neste julgamento, que tratou da venda de créditos do ICMS, foi estabelecido que receita pode ser definida como “ingresso financeiro que se integra no patrimônio na condição de elemento novo e positivo, sem reservas ou condições”. Vejam que há uma particular diferença entre esta definição e a contábil, a qual alcança todos os ingressos econômicos.
Este é um importante precedente a favor do contribuinte, em que pese esta decisão não ter efeito “erga omnis”, ou seja, está restrita às partes.
Como está a discussão no judiciário?
A discussão acerca do alcance da definição de receita, por abranger um conceito constitucional, depende da palavra final do STF, o qual, aliás, já reconheceu em 2015 a repercussão geral desta matéria. No Recurso Extraordinário 835.818 - ainda não julgado - a União questiona a decisão da Justiça Federal e o entendimento do Tribunal Regional Federal da 4ª Região Fiscal, favoráveis à não incidência do PIS e da COFINS.
Conclusão
Como disse no início deste artigo, o objetivo era alertar sobre uma questão polêmica e pouco conhecida. Acredito que foi possível apresentar neste texto qual é o entendimento fiscal sobre este assunto.
Como há bons argumentos jurídicos contrários a este entendimento fiscal - inclusive do próprio STF - meu conselho não poderia ser que as empresas que antes desconheciam este fato passem a simplesmente pagar PIS e COFINS.
Não podemos, no entanto, ignorá-los e o seu risco deve ser compartilhado e gerenciado pelas organizações, pois enquanto não for promulgada a decisão final do STF, não teremos certeza absoluta quanto aos desdobramentos desta discussão.
Fonte: Linked in
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Compartilhando idéias e experiências sobre o cenário tributário brasileiro, com ênfase em Gestão Tributária; Tecnologia Fiscal; Contabilidade Digital; SPED e Gestão do Risco Fiscal. Autores: Edgar Madruga e Fabio Rodrigues.