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Contabilidade de Seguros no Brasil


Por Ahmed Sameer El Khatib

A contabilidade de seguros pode ser considerada uma das mais complexas áreas na aplicação das Normas Internacionais de Contabilidade (International Financial Reporting Standards – IFRS), em função do alto grau de incerteza associado com os fluxos de caixa dos contratos, a análise de risco e a diversidade dos produtos oferecidos aos clientes. Com o advento da Lei nº 11.638/07, o Brasil deu um salto importante em direção à adoção das IFRS, emanadas pelo International Accounting Standards Board – IASB.

A Contabilidade Internacional surgiu para minorar as agruras de quem quer investir fora de seu país e até hoje tinha que manusear balanços em dezenas de Normas Contábeis distintas, tentando compatibilizá-las para comparar. (CARVALHO, p.15)

A introdução de IFRS no mundo, segundo o plano global de convergência do IASB, e o compromisso de diversos países na adoção das Normas Internacionais de Contabilidade indicam que talvez um dia não seja mais necessária a elaboração de artigos, tabelas ou resumos detalhados sobre eventuais diferenças de GAAP para a conversão das demonstrações contábeis de uma entidade para determinado princípio contábil.

Em abril de 2001, o IASB herdou um projeto compreensivo de seguros iniciado pelo IASC em abril de 1997. Em 2003, foi elaborado um documento de exposição chamado ED 5 – Insurance Contracts (criado em julho de 2003), que é considerado a origem do IFRS 4 – Insurance Contracts.

O IFRS 4 marcou o fim das incertezas e deliberações existentes nos diferentes princípios contábeis utilizados para avaliação de contratos de seguro no mundo. (MOURAD, p. 8)

O IFRS 4, vigente a partir de 1º de janeiro de 2005, é o resultado da Fase I do projeto do IASB para contratos de seguro. (MOURAD, p. 12). Um projeto compreensivo para a contabilidade de seguros, conhecido como Fase II, está em andamento.

Os requerimentos mínimos na versão final do IFRS 4 para avaliação e divulgação de contratos de seguro são considerados, de certa forma, modestos perante as mudanças estruturais esperadas para a Fase II. (CLARK, 2003).

Durante o desenvolvimento do IFRS 4, o IASB se deparou com um grande desafio: como criar uma norma para contratos de seguro com base em princípios? Todas as grandes seguradoras no mundo sabiam que os produtos de seguros haviam se diversificado ao longo dos últimos anos para atender às necessidades dos clientes, que demandam produtos com retornos sobre os prêmios, devoluções de prêmios e coberturas especiais. Conseqüentemente, o IASB notou a existência de várias práticas contábeis no mundo para contratos de seguro e uma diversidade de produtos a serem analisados.           

A diversidade de produtos oferecidos pelas seguradoras aos seus clientes e complexas cláusulas contratuais que transferem riscos financeiros e de seguro entre as partes no contrato têm representado um novo desafio à contabilidade na aplicação de IFRS. (SILVA, p. 132)

Os produtos de acumulação atualmente no mercado indicam a existência de uma gama de riscos que incluem variáveis financeiras especificas e não especificas à entidade, juntamente com coberturas acessórias e garantia de pagamentos mínimos de juros durante a fase de acumulação ou fase de beneficio dos contratos.

No caso do Brasil, um grande salto rumo à convergência com as normas internacionais foi trazido pela Circular SUSEP 357/2007 que prevê o desenvolvimento de ações especificas pela própria SUSEP para identificar a necessidade de alteração das normas para o mercado supervisionado, objetivando a adoção do IFRS. Em 30 de outubro de 2008, a SUSEP emitiu a Carta-Circular nº 007/08 que inclui diversas deliberações para aplicação do IFRS 4. Em 5 de dezembro de 2008 foi aprovado o CPC 11 – Contrato de Seguros pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC).

A história do seguro no Brasil, que começou em 1808 com a abertura dos Portos ao comércio internacional, teve marco importante no ano de 1996, com a liberação da entrada de empresas estrangeiras no mercado (que haviam fechado suas Sucursais em fins do século XIX por divergência com a regulamentação) e a quebra do monopólio ressegurador do IRB.

Essa abertura do mercado brasileiro às seguradoras estrangeiras mantém estrita sintonia com a tendência de globalização dos mercados, que nos últimos anos vem ocorrendo em grande escala (FENASEG, 2007).

O sistema segurador brasileiro é composto por mais de 150 companhias, das quais 70% são seguradoras, e há aproximadamente 70.000 corretores devidamente habilitados e registrados (FENASEG, 2008). O mercado segurador brasileiro ainda apresenta grande índice de concentração, pois as oito maiores seguradoras representam mais de 50% do volume de prêmios concentrados nos ramos vida, automóveis e saúde.

Dados da Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados (FENASEG, 2011) indicam que no ano de 2010, o Brasil ocupava o vigésimo primeiro lugar no ranking mundial de seguros para todos os ramos. A arrecadação do mercado segurador brasileiro teve um aumento de 18% de 2009 para 2010, partindo de uma arrecadação de 12 bilhões em 1995 para quase 97 bilhões em 2010, conservando sempre o padrão de crescimento.

Em relação à regulamentação, as seguradoras devem seguir as normas contábeis instituídas pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC), as normas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), quando Companhias Abertas, e as normas da SUSEP. Além disso, devem seguir a Lei 6404/76 (que dispõe sobre as sociedades anônimas), já que para atuar no Brasil as seguradoras devem ser constituídas sob a forma de sociedade anônima.

Nesse contexto, tem-se que a confiança no sistema de informações contábeis é elemento essencial para assegurar que o mercado doméstico e global esteja alocando capitais eficientemente. A alocação eficiente de capital é fator fundamental para geração de emprego e renda, o que em última análise é o objetivo maior de qualquer sociedade organizada. Uma forma de alcançar essa confiança seria por meio da padronização das normas contábeis.

As duas principais normas que regem a contabilidade das seguradoras brasileiras são segundo SUSEP (2008):

Circular SUSEP n° 334 de 2 de janeiro de 2007 – “Dispõe sobre alterações das Normas Contábeis a serem observadas pelas sociedades seguradoras, resseguradoras, sociedades de capitalização e entidades abertas de previdência complementar, instituídas pela Resolução CNSP nº 86 de 3 de setembro de 2002”.

Circular SUSEP n° 379 de 19 de dezembro de 2008 – “Dispõe sobre as alterações das Normas Contábeis a serem observadas pelas sociedades seguradoras, resseguradoras, de capitalização e entidades abertas de previdência complementar, instituídas pela Resolução CNSP nº 86 de 03 de setembro de 2002”.

Essas normas também são aplicadas às sociedades seguradoras especializadas em saúde, reguladas pela ANS (Agência Nacional de Saúde) e pelo CONSU (Conselho de Saúde Suplementar). Os anexos dessas normas contêm o modelo de contabilização das operações, e os modelos dos planos de contas das demonstrações financeiras exigidas, assim como suas codificações.

Diante da necessidade de harmonização contábil com as Normas Internacionais de Contabilidade (IFRS), o CPC emitiu em 30 de outubro de 2008 o “CPC 11” intitulado “Contratos de Seguro” correlacionado à IFRS 04.

O principal objetivo do CPC 11 foi especificar o reconhecimento contábil para os contratos de seguro por parte de qualquer entidade que emitisse tais contratos, em particular, determinou limitadas melhorias na contabilização de contratos de seguros por parte das seguradoras e incentivou uma melhor divulgação que identificasse e explicasse os valores resultantes de contratos de seguro nas demonstrações contábeis da seguradora.

No caso brasileiro, com o advento do CPC 11 e CPC 14, as normas ficaram similares às internacionais. Antes disso, entretanto, não existia uma norma específica para a identificação e contabilização de garantias financeiras emitidas por uma entidade seguradora.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Resolução CNSP n. 86, de 19 de agosto de 2002. Dispõe sobre as Normas Contábeis a serem observadas pelas sociedades seguradoras, resseguradoras, de capitalização e entidades abertas de previdência complementar, e dá outras providencias. Disponível em: http://www.susep.gov.br/menubiblioteca/biblioteca.asp. Acesso em 16 junho 2009.

CARVALHO, L. Nelson. Contabilidade Internacional: aplicação das IFRS. 2005/ L. Nelson Carvalho, Sirlei Lemes, Fábio Moraes da Costa. – São Paulo, Atlas, 2006.

CLARK, I. M.; MCMANUS, K. Vantagens de implementar já as normas internacionais de Contabilidade - o caso brasileiro. PricewaterhouseCoopers. Dezembro, 2003. Disponível em: <http://www.pwc.com/br>. Acesso em: 12 de julho. 2012.

CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis. Disponível em www.cpc.org.br. Acesso em 23 junho 2009.

FENASEG – Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados e de Capitalização Disponível em www.fenaseg.org.br . Acesso em 23 de setembro de 2012.

IFRS 4, IASB, Insurance Contracts, 2004.

MOURAD, Nabil Ahmad, IFRS: Introdução à Contabilidade Internacional de Seguros. Nabil Ahmad Mourad, Alexandre Paraskevoupoulos – São Paulo, Saraiva, 2009.

SILVA, J.C., Práticas Contábeis das Operações de Seguros. Funenseg, Série Cadernos de Seguros: Teses. Rio de Janeiro, 2005. p. 131-144.

SUSEP - Superintendência de Seguros Privados. Disponível em: http://www.susep.gov.br/principal.asp Acesso em: 06 de julho de 2012.

Fonte: Essência Sobre a Forma

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