Pular para o conteúdo principal

A Declaração de Inidoneidade e seu efeito “ex nunc”

A Declaração de Inidoneidade e seu efeito “ex nunc”

É cediço que uma das maiores fontes de renda de grandes empresas pode advir de contratos feitos com a Administração Pública. Assim, seguindo-se os procedimentos instaurados pela lei n° 8.666/93, a qual normatiza as formas de Licitação, as empresas vencedoras podem contratar com os Órgãos Públicos, sendo o objeto de tais contratos bastante diversificado, podendo englobar: obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações, no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, Distrito Federal e Municípios.

Os contratos firmados com a Administração Pública, por envolverem, em sua maioria, quantias vultosas, são muito visados e concorridos. Por este motivo, atos ilícitos, que ensejem a contratação, podem ocorrer, sendo estes bastante comuns. Citem-se como exemplos mais atuais as diversas empresas que contrataram com a Petrobrás, por meios fraudulentos à Licitação. Destarte, com vistas a punir tal comportamento a Lei 8.666/93, previu, nos seus artigos 87 e 88, sanções à aquelas empresas que, de alguma maneira, desvirtuarem o processo licitatório.

Veja o que dispõem os artigos supramencionados:

“Art. 87.  Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:

I – advertência;

II – multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato;

III – suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos;

IV – declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior.

  • 1o Se a multa aplicada for superior ao valor da garantia prestada, além da perda desta, responderá o contratado pela sua diferença, que será descontada dos pagamentos eventualmente devidos pela Administração ou cobrada judicialmente.

  • 2o As sanções previstas nos incisos I, III e IV deste artigo poderão ser aplicadas juntamente com a do inciso II, facultada a defesa prévia do interessado, no respectivo processo, no prazo de 5 (cinco) dias úteis.

  • 3o A sanção estabelecida no inciso IV deste artigo é de competência exclusiva do Ministro de Estado, do Secretário Estadual ou Municipal, conforme o caso, facultada a defesa do interessado no respectivo processo, no prazo de 10 (dez) dias da abertura de vista, podendo a reabilitação ser requerida após 2 (dois) anos de sua aplicação.”     (Vide art 109 inciso III)

“Art. 88.  As sanções previstas nos incisos III e IV do artigo anterior poderão também ser aplicadas às empresas ou aos profissionais que, em razão dos contratos regidos por esta Lei:

I – tenham sofrido condenação definitiva por praticarem, por meios dolosos, fraude fiscal no recolhimento de quaisquer tributos;

II – tenham praticado atos ilícitos visando a frustrar os objetivos da licitação;

III – demonstrem não possuir idoneidade para contratar com a Administração em virtude de atos ilícitos praticados.”



Pode-se afirmar, portanto, que a punição, no âmbito administrativo, mais complexa a aqueles que praticam atos ilícitos e que frustram os objetivos da Licitação, é a Declaração de Inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública. Com efeito, a Lei n° 8.666/93, tenta moralizar o procedimento licitatório, impedindo assim, que empresas que cometeram fraudes à licitação contratem, por tempo determinado, novamente com a Administração Pública. “A inidoneidade consiste na ausência dos requisitos de confiabilidade e capacitação (em sentido amplo) para executar contrato administrativo. Não se pode supor que um sujeito seja inidôneo apenas para contratar com uma determinada entidade administrativa”, (Revista Zênite, PERGUNTAS E RESPOSTAS – 390/39/MAI/1997).

Ocorre que, é sabido que a ocorrência do motivo não obriga a rescisão dos contratos que já tenham sido assinados pala empresa declarada inidônea e a Administração, competindo a essa última avaliar se o interesse público estará melhor atendido com a rescisão, ou se com a continuidade da execução do contrato.

O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que a pena de inidoneidade só produz efeitos para o futuro, sem intervir nos contratos já existentes e em andamento, ao entendimento de que a rescisão imediata de todos os contratos firmados entre o sancionado e a Administração Pública poderia conferir prejuízos ao erário e ao interesse público, in verbis:



“ADMINISTRATIVO – LICITAÇÃO – INIDONEIDADE DECRETADA PELA CONTROLADORIA GERAL DA UNIÃO – ATO IMPUGNADO VIA MANDADO DE SEGURANÇA. 1. Empresa que, em processo administrativo regular, teve decretada a sua inidoneidade para licitar e contratar com o Poder Público, com base em fatos concretos. 2. Constitucionalidade da sanção aplicada com respaldo na Lei de Licitações, Lei 8.666/93 (arts. 87 e 88). 3. Legalidade do ato administrativo sancionador que observou o devido processo legal, o contraditório e o princípio da proporcionalidade. 4. Inidoneidade que, como sanção, só produz efeito para o futuro (efeito ex nunc), sem interferir nos contratos já existentes e em andamento. 5. Segurança denegada”.

O posicionamento, no sentido de que a declaração de inidoneidade não é apta a produzir automaticamente a rescisão dos contratos administrativos firmados pelo sancionado com o Poder Público foi acolhido também pelo Tribunal de Contas da União, em consonância com o que já foi firmado no  Superior Tribunal de Justiça. Veja a seguir a Acórdão 3002/2010 – TCU – Plenário:



Sumário 

RECURSO DE RECONSIDERAÇÃO. CONHECIMENTO. PROVIMENTO PARCIAL. ALTERAR REDAÇÃO DO ITEM 9.3.1. DO ACÓRDÃO 1262/2009 – TCU- PLENÁRIO, DE MODO A CONFERIR EDEITOS EX-NUNC À DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE DAS EMPRESAS. CIÊNCIA.

Ministro Relator 

JOSÉ JORGE

Voto do Ministro Relator

(…)

4. Ao compulsar os exames empreendidos pela Serur, com os quais o Ministério Público junto ao TCU manifestou-se de acordo, vejo que a unidade técnica sugere que seja dado provimento parcial aos apelos em face de dois tópicos, a saber: a) adeclaração de inidoneidadeapenas produz efeitos ex-nunc; e b) a participação da empresa Aeropostal na fraude retratada nos autos era diversa das demais, dando azo à declaração de inidoneidade por prazo diferente daquele imposto às demais empresas participantes da fraude.5. Quanto ao primeiro tópico, relativo à eficácia dadeclaração de inidoneidade,manifesto-me de acordo com os exames empreendidos nos autos, pois, com amparo na moderna jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – STJ e do Tribunal Regional Federal da 1ª Região – TRF-1, concluiu-se que a declaração de inidoneidade não dá ensejo à imediata rescisão de todos os contratos firmados entre as empresas sancionadas com a administração pública federal. Isso porque a declaração de inidoneidade apenas produz efeitos ex-nunc, não autorizando que sejam desfeitos todos os atos pretéritos ao momento de sua proclamação.6. Nesse sentido, são plenamente aplicáveis os escólios do Exmo. Ministro Teori Albino Zavascki, exarados nos autos do MS 13.964/DF, cuja ementa transcrevo a seguir:“ADMINISTRATIVO. DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE PARA LICITAR E CONTRATAR COM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. VÍCIOS FORMAIS DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. INEXISTÊNCIA. EFEITOS EX NUNC DA DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE: SIGNIFICADO.

(…)

7. Em acréscimo às ponderações de Sua Excelência, as quais adoto como razões de decidir, pondero que a rescisão de todos os contratos anteriormente celebrados pela empresa declarada inidônea nem sempre se mostra a solução mais vantajosa para a administração pública, pois, dependendo da natureza dos serviços pactuados, que em algumas situações não podem sofrer solução de continuidade, não seria vantajoso para a administração rescindir contratos cuja execução estivesse adequada para celebrar contratos emergenciais, no geral mais onerosos e com nível de prestação de serviços diverso, qualitativamente, daquele que seria obtido no regular procedimento licitatório.(…)”



Com a análise dos precedentes supracitados, se pode concluir: (i)  a declaração de inidoneidade só produz efeito para o futuro (efeito ex nunc), sem interferir nos contratos já existentes e em andamento; (ii) a sanção inibe a empresa de licitar ou contratar com a Administração Pública” (Lei 8.666/1993, art. 87), sem, no entanto, acarretar, automaticamente, a rescisão de contratos administrativos já aperfeiçoados juridicamente e em curso de execução, notadamente os celebrados perante outros órgãos administrativos não vinculados à autoridade impetrada ou integrantes de outros entes da Federação (Estados, Distrito Federal e Municípios); (iii) a ausência do efeito rescisório automático não compromete nem restringe a faculdade que têm as entidades da Administração Pública de, no âmbito da sua esfera autônoma de atuação, promover medidas administrativas específicas para rescindir os contratos, nos casos autorizados e observadas as formalidades estabelecidas nos artigos 77 a 80 da Lei 8.666/1993.

Tem-se, assim, com o efeito “ex nunc” da Declaração de Inidoneidade, que empresas inidôneas podem continuar a prestarem seus serviços à Administração, sendo tal ato totalmente legal. Não obstante a tentativa de punição, o próprio Direito encontra caminhos lícitos para a continuação da prestação de serviços.

Destarte, importante frisar que, mesmo havendo Lei que condene as práticas irregulares de pessoas jurídicas no que concerne à contratação com a Administração Pública, tem-se que a corrupção ainda impera e tem aumentado com o passar do tempo. E ainda, o Legislativo continua a promulgar novas Leis no sentido de coagir a prática de corrupção, exemplo disso é a lei n° 12.846/2013 (Lei Anticorrupção). Assim, entende-se ser necessária uma aplicabilidade mais enfática das leis vigentes, para que o Brasil deixe de ser apenas um país de leis, mas transforme-se também em um país da Justiça.

Anna Tereza Castro Silva Ribeiro

Fonte: Notícias Fiscais

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O sol nunca deixa de brilhar acima das nuvens

Sempre que viajo e vejo esta cena fico muito emocionado. O Sol brilhando acima das nuvens. Sempre me lembro desta mensagem: "Mesmo em dias sombrios , com o céu encoberto por densas e escuras nuvens, acima das nuvens o Sol continuará existindo. E o Sol voltará a iluminar, sem falta. Tenhamos isto sempre em mente e caminhemos buscando a luz! Quando voltarmos os nossos olhos em direção à luz e buscamos na vida somente os lugares onde o Sol brilha, a luz surgirá" Seicho Taniguchi Livro Convite para um Mundo Ideal - pág. 36 Que super mensagem Deus nos oferta.  Você quer renovar a sua experiência com Deus?  Procure um lugar quieto e faça uma oração sincera a Deus do fundo do seu coração pedindo para que a vontade dele prevaleça em sua vida. Tenho certeza que o sol da vida, que brilha acima das nuvens escuras, brilhará também em você !!!

Sonegação não aparece em delação premiada, mas retira R$ 500 bi públicos

Empresário que sonega é visto como vítima do Estado OS R$ 500 BILHÕES ESQUECIDOS Quais são os fatores que separam mocinhos e vilões? Temos acompanhado uma narrativa nada tediosa sobre os “bandidos” nacionais, o agente público e o político corruptos, culpados por um rombo nos cofres públicos que pode chegar a R$ 85 bilhões. Mas vivemos um outro lado da história, ultimamente esquecido: o da sonegação de impostos, que impede R$ 500 bilhões de chegarem às finanças nacionais. Longe dos holofotes das delações premiadas, essa face da corrupção nos faz confundir mocinhos e bandidos. O sonegador passa por empresário, gerador de empregos e produtor da riqueza, que sonega para sobreviver aos abusos do poder público. Disso resulta uma espécie de redenção à figura, cuja projeção social está muito mais próxima à de uma vítima do Estado do que à de um fora da lei. Da relação quase siamesa entre corrupção e sonegação, brota uma diferença sutil: enquanto a corrupção consiste no desvio

AS 5 PRINCIPAIS CAUSAS DE ESTOQUE NEGATIVO OU SUPERFATURADO

O controle de estoque é um gargalo para as empresas que trabalham com mercadorias. Mesmo controlando o estoque com inventários periódicos as empresas correm o risco de serem autuadas pelos FISCOS, uma vez que nem sempre o estoque contabilizado pela empresa representa o seu real estoque. Partindo dessa análise pode-se dizer que as empresas possuem pelo menos três inventários que quase sempre não se equivalem. O primeiro é o inventário realizado pela contagem física de todos os produtos do estabelecimento. O segundo inventário é fornecido pelo sistema de gestão (ERP). Por fim, tem-se o INVENTÁRIO FISCAL que é o quantitativo que o FISCO espera que a empresa possua. E COMO O FISCO CALCULA ESSE ESTOQUE? O cálculo é feito pela fórmula matemática onde [ESTOQUE INICIAL] + [ENTRADAS] deve ser igual [SAÍDAS] + [ESTOQUE FINAL]. Ocorrendo divergências pode-se encontrar Omissão de Entrada ou Omissão de Saída (Receita). A previsão legal para tal auditoria encontra-se no Artigo 41, da Lei